sábado, 29 de agosto de 2009

verdade


Eu disse-te a verdade, esperando que a verdade fosse o suficiente, que na sua imensidão tocasse o mundo e o endireitasse, que ela própria, forte terrível evidente, fosse o suficiente para entrar dentro de ti e te mudar o mundo. Esperei o teu olhar límpido, cheio da verdade que entrara em ti e saíra de mim. Num súbito clarão de certeza – esta era a primeira vez que era totalmente honesta com alguém, não sem medos, mas com as palavras alimentadas do meu corpo – soube que não era suficiente, que não podia esperar mais de ti ou de mim, que tudo o que éramos continuaria inalterado. Tu tinhas esperado por mim, é certo. E agora, com a verdade do mundo sobre nós, era a minha vez de esperar por ti. Nunca fui boa a fazê-lo. Não posso esperar. Não vou esperar por ti. Eu desejei-te e tu negaste-te. Deixaste-me sem nada, sem protecção dos olhares, porque disse a verdade e depois de dita a verdade não há uma mentira segura para a qual se possa fugir. Não há nada. Aquilo com que a verdade me deixou foi apenas ela. E mais nada. Tu deténs essa janela para dentro de mim e continuas protegida pelos teus véus, longe dos olhares que não queres que te perscrutem, longe do meu exame. O que lá está, não saberei, porque a verdade para ti não tem valor absoluto mas relativo. E não jogas com ela. Eu agora já não sei fazer de outra forma e a verdade sai-me sem querer, como verborreia incontrolável, não posso fazer outra coisa senão dizê-la, e afastar-te de mim, cada vez mais, sem solução, com a verdade em punho.
Estás bem?
Verdade.
Ok. Tenho de ir.
Adeus.
E lá vais para essa tua vida onde eu não entro.
Um dia disseste-me porque estavas aqui, eu também te disse.
A minha missão é a verdade.
Somos incompatíveis.

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