segunda-feira, 5 de outubro de 2009

céu vermelho dor

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Conseguir voltar a respirar vai ser a minha grande obra futura. Doem-me os ossos e o peito, tenho frio, como se a ponta dos meus dedos até à minha garganta, tudo tivesse gelado. As mãos não se agitam como dantes, escrevendo. Estou presa de uma imobilidade invernosa, completamente gelada. O meu rosto fecha-se sobre si próprio e a noite parece-me ainda mais escura. A cada palavra que digito perco ar e força. Parece que estou a morrer. Mas estou só a tentar esquecer-te.



O céu lá fora está vermelho. Choveu todo o dia e nunca houve qualquer luz. Agora os prédios fundem-se com o vermelho do céu e isso parece-me fazer sentido porque a minha alma está negra. O vidro embaciado desfoca-me a visão. Pressinto o nevoeiro, mas isso não quer dizer que ele existe. Parece que vi mal todo o dia. Vi mal os dias todos. Senti mal. Há muito tempo que não vejo nada com clareza. Agora o céu vermelho parece-me saído de um negro conto. Mas é real. Parece-me agora que não há céu, mas um tecto. Um tecto baço e avermelhado. Um limite acima do prédio mais alto, onde tudo termina. E mais uma vez tudo me parece saído de uma outra vida, uma vida irreal, de uma personagem num livro. Tenho dificuldade em perceber que sou eu que continuo aqui e nada me espera a não ser a repetição de todos os gestos anteriores. Amanhã. Depois. O que me espera é o dia de hoje, outra vez. Sei que não vai ser assim, que vou voltar a respirar. Que ansiarei outra vez. E terei esperança e serei sorridente com essa esperança colada nos cabelos. Como d’antes. Como se adiantasse alguma coisa. De novo cairei. De novo o meu corpo ficara inamovível neste espaço e nunca serei suficiente para ser amada. O céu será vermelho de novo. Um vermelho baço e tenebroso. Eu serei este esqueleto, estes braços, estes olhos cansados, a arder, vermelhos. O mundo vai continuar a ter dias, noites, momentos. Não sei se estarei nele, com o meu corpo pequeno e impotente. Minúscula para ti, para mim, não tenho significado, sou demasiado ínfima, nem sequer me devia importar com a sequência dos meus actos, os actos destas mãos pequenas, desta voz fina, nada disso deveria ter consequências algumas no enorme mundo. Se eu for, o céu continuara a ser vermelho esta noite. Tu terás dormido noutros braços, eu terei sido devorada pela minha própria vontade falhada, tão insignificante como sempre fui, tão pequena e invisível como todos os dias que vivi. E pergunto-me agora como posso ter tanto choro, tanto tanto tanto, se continuo a ser tão minúscula que estou a desaparecer e nunca mais desapareço porque ainda há choro, choro interminável para hoje e amanhã e todas as noites de céu vermelho, muito vermelho.


Vou tentar movimentar-me para o dia seguinte, pode ser que ele passe por mim como este, enquanto eu tento respirar. É só reciclar ar.


Raras vezes o céu está vermelho, amanhã pode estar simplesmente negro e chuvoso. Todas as noites serão escuras agora que entrámos no Outono. todos caminham para o escuro do inverno. Eu não sei para onde vou.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

angeldeamon

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Às vezes não sei se és um anjo ou um demónio.
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Escravizas-me aos teus instintos.

sábado, 29 de agosto de 2009

verdade

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Eu disse-te a verdade, esperando que a verdade fosse o suficiente, que na sua imensidão tocasse o mundo e o endireitasse, que ela própria, forte terrível evidente, fosse o suficiente para entrar dentro de ti e te mudar o mundo. Esperei o teu olhar límpido, cheio da verdade que entrara em ti e saíra de mim. Num súbito clarão de certeza – esta era a primeira vez que era totalmente honesta com alguém, não sem medos, mas com as palavras alimentadas do meu corpo – soube que não era suficiente, que não podia esperar mais de ti ou de mim, que tudo o que éramos continuaria inalterado. Tu tinhas esperado por mim, é certo. E agora, com a verdade do mundo sobre nós, era a minha vez de esperar por ti. Nunca fui boa a fazê-lo. Não posso esperar. Não vou esperar por ti. Eu desejei-te e tu negaste-te. Deixaste-me sem nada, sem protecção dos olhares, porque disse a verdade e depois de dita a verdade não há uma mentira segura para a qual se possa fugir. Não há nada. Aquilo com que a verdade me deixou foi apenas ela. E mais nada. Tu deténs essa janela para dentro de mim e continuas protegida pelos teus véus, longe dos olhares que não queres que te perscrutem, longe do meu exame. O que lá está, não saberei, porque a verdade para ti não tem valor absoluto mas relativo. E não jogas com ela. Eu agora já não sei fazer de outra forma e a verdade sai-me sem querer, como verborreia incontrolável, não posso fazer outra coisa senão dizê-la, e afastar-te de mim, cada vez mais, sem solução, com a verdade em punho.
Estás bem?
Verdade.
Ok. Tenho de ir.
Adeus.
E lá vais para essa tua vida onde eu não entro.
Um dia disseste-me porque estavas aqui, eu também te disse.
A minha missão é a verdade.
Somos incompatíveis.
 

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